Deficiência de GH no Idoso e Somatopausa

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Deficiência de GH no Idoso e Somatopausa

por site em 21 de maio de 2008


Prof. Dr. Cesar Luiz Boguszewski
SEMPR, Serviço de Endocrinologia e Metabologia do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná, Curitiba, Paraná, Brasil; cesarluiz@hc.ufpr.br

Em meados da década de 80, o hormônio de crescimento humano (GH) começou a ser produzido em escala industrial através de técnicas de DNA recombinante. Na mesma época, uma nova entidade denominada "síndrome de deficiência de GH em adultos (DGHA)" passou a ser definida e caracterizada, ampliando-se o potencial terapêutico do GH.

O diagnóstico de DGHA deve ser considerado apenas em indivíduos com evidência de doença, trauma, cirurgia ou radioterapia na região hipotalâmica-hipofisária – particularmente naqueles em tratamento de reposição com hormônio tireoideano, corticosteróide e esteróides sexuais – nos portadores de distúrbios genéticos que afetam os somatotrófos e naqueles previamente tratados com GH na infância por DGH.

As causas de DGHA são muito variadas e incluem principalmente doenças neoplásicas (tumores não funcionantes, prolactinomas, craniofaringeomas, meningeomas), vasculares (Síndrome de Sheehan), infiltrativas (sarcoidose, histiocitose), inflamatórias (hipofisite) e genéticas (mutação no Pit-1 e Prop-1).

Os achados clínicos da DGHA não são específicos e incluem alterações na composição corporal, anormalidades metabólicas e cardiovasculares, e redução nos escores de qualidade de vida. O quadro clínico é influenciado pelo período de instalação, se na infância (" childhood-onset") ou na vida adulta ( "adulthood-onset"), e pela presença ou não de outras deficiências hormonais associadas.

O envelhecimento está associado com mudanças físicas similares às observadas em indivíduos com DGH. Além disso, há uma queda fisiológica na secreção de GH e IGF-1 que se inicia ao redor dos 30 anos e evolui gradual e progressivamente com a idade – processo conhecido como somatopausa. Conseqüentemente, o diagnóstico de DGHA é particularmente difícil de se estabelecer em indivíduos idosos, uma vez que o teste de hipoglicemia insulínica (THI), considerado padrão-ouro no diagnóstico laboratorial, é muitas vezes contra-indicado em indivíduos idosos (especialmente nos cardiopatias ou naqueles com doenças neurológicas associadas), e os valores de IGF-1 estão dentro da faixa normal em até 60% dos casos.

Uma alternativa proposta é o teste da arginina, com valor de corte de 2 ng/ml. Entretanto, estudos controlados demonstram que idosos com DGHA apresentam aumento de gordura corporal (principalmente abdominal), alterações metabólicas e redução nos níveis de GH e IGF-1, que são significativamente mais severas do que as alterações decorrentes da somatopausa, e similares às encontradas em indivíduos mais jovens com DGHA. Uma diferença notável refere-se à massa óssea, que é reduzida em jovens com DGHA, mas é normal em idosos com DGHA. A terapia com GH pode ser indicada em idosos com DGHA, lembrando que as doses são usualmente mais baixas do que aquelas utilizadas em indivíduos mais jovens. Como este grupo tem maiores riscos de apresentar efeitos adversos, recomenda-se monitoramento cuidadoso para complicações decorrentes de retenção de fluidos, desenvolvimento de intolerância à glicose, diabetes e tumores.

Não há quaisquer evidências até o momento que o uso de GH pode ser útil na somatopausa. Se de um lado existem evidências epidemiológicas apontando a somatopausa como um fator deletério para a saúde, por outro há evidências que ela possa representar um processo adaptativo benéfico ao organismo. Obviamente, não existem critérios clínicos ou laboratoriais para se diagnosticar somatopausa. Em conseqüência, os estudos realizados até o momento para avaliar os efeitos do GH na somatopausa variaram em termos de grupos estudados, critérios de inclusão, métodos de avaliação de composição corporal, dose e duração de tratamento. Muitos não foram controlados com placebo e não avaliaram melhora funcional.

De modo geral, os estudos demonstram que o uso de GH em idosos sem DGHA provoca redução da massa gordurosa e aumento da massa magra, mas sem provocar mudanças funcionais em termos de força muscular, consumo máximo de oxigênio ou capacidade de exercício. Em contraste, exercício de resistência é capaz de promover melhora na massa e na força muscular em idosos saudáveis.

A incidência de efeitos adversos é alta em idosos e resulta numa alta taxa de abandono do tratamento. O uso de GH não tem qualquer efeito benéfico no perfil lipídico, massa óssea, funções cognitivas e qualidade de vida. Os melhores resultados encontrados na terapia com GH foram redução no tempo de recuperação após fratura de quadril em idosos com mais de 75 anos e melhora nos parâmetros metabólicos e na força muscular de pacientes urêmicos em hemodiálise.

Nos últimos anos, os secretagogos peptídicos e não-peptídicos do GH surgiram como uma alternativa promissora para uso na somatopausa, mas os dados referentes aos riscos e benefícios destes agentes em idosos saudáveis são ainda bastante preliminares.